O Fernando Pessoa, ainda em Durban, na África do Sul, com a idade de 12 anos, surpreende-nos com esta carta de amor equívoca. A carta, atribuída a H.W.M. surgiu nas páginas de um pseudojornal que Fernando Pessoa elaborou em Abril de 1901. Não é uma criação inteiramente original, já que este tipo de missiva (Cópia de uma Curiosa Carta de Amor de um Cavaleiro para uma Dama) circulava no Reino Unido e nos Estados Unidos da América desde c. 1840, em folhas volantes, apenas com ligeiras variações. O jovem Pessoa terá, então, entrado no jogo da variação do modelo, não deixando, todavia, de nos surpreender.
Aviso prévio: Após ler, começar de novo na primeira linha e ler cada linha alternadamente até ao final.
Carta
de amor equívoca
À -
O grande amor
que até agora te comuniquei
é falso, e creio
que a minha indiferença por ti
cresce a cada
dia. Quanto mais te vejo, mais
apareces a meus
olhos como digna de desprezo,
sinto que estou
inteiramente disposto e determinado a
odiar-te. Acredita
que nunca tive intenção de
conceder-te a minha
mão. A nossa última conversa
deixou-me com uma
monotonia tediosa, que de forma alguma
me proporcionou
a mais exaltante imagem do teu carácter,
o teu
temperamento tornar-me-ia extremamente infeliz
e ao unirmo-nos,
não sentiria senão o
ódio dos meus
pais, juntamente com o interminável des-
agrado de viver
contigo. Eu tenho, de facto, um coração
para oferecer,
mas não quero que o imagines
ao teu serviço,
não podendo dá-lo a ninguém mais
inconsistente e
caprichoso que a ti e menos
capaz de honrar
a minha escolha e família.
Sim, espero que fiques
persuadida de que
falo de forma
sincera e far-me-ás um favor ao
ignorar-me. Dou-te
licença de evitares o trabalho de
responder a isto,
as tuas cartas são sempre cheias de
impertinências,
e não tens a mais pequena noção de
génio e bom
senso. Adieu! Adieu! Imagina—me
tão adverso a ti
que me é impossível alguma vez ser
o teu mais
afectuoso amigo e humilde servo.
H.W.M., nome fictício de Fernando Pessoa, 2 de Abril de 1901 Em “Eu Sou uma Antologia-136 autores fictícios”, de Jerónimo Pizarro, pp 25
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