sábado, 15 de setembro de 2012

Bocage

Há 247 anos nasceu em Setúbal o poeta Manuel Maria Barbosa du Bocage. Nasceu em 15 de Setembro de 1765, na Rua Edmond Bartissol 12 (antiga Rua de São Domingos), onde hoje está um museu, desde 1965. Bocage foi sempre um revoltado. Contra tudo e todos. Como explicar? Infância terrível. Filho de bacharel, que foi preso por dívidas ao Estado quando ele tinha 3 anos. Reinava o Marquês de Pombal. E a mãe morreu quando ele tinha 10 anos. Aos 16 anos, assentou praça. Foi depois para Lisboa, frequentar a Escola da Marinha. Andou por lá 5 anos, mas não acabou o curso. Café Nicola em Lisboa. Bebia muito, sobretudo, bebidas alcoólicas. Face ao seu comportamento, foi enviado, em 1786, para a Índia. Passou pelo Brasil, Rio de Janeiro, Moçambique, finalmente, Goa. Mas Bocage, que detestou Goa, não se terá portado lá muito bem. O Governador despachou-o para Damão. Pior ainda. Desertou. Embarcou depois para Macau. Em 1790,  está de novo no Continente.
Adere à Nova Arcádia, onde adoptou o pseudónimo Elmano Sadino.  Vive do que os amigos lhe dão. Dominava então Lisboa o Intendente da Polícia Pina Manique que decidiu pôr ordem na cidade, tendo em 7 de Agosto de 1797 dado ordem de prisão a Bocage por ser “desordenado nos costumes”. Ficou preso no Limoeiro até 14 de Novembro de 1797, tendo depois dado entrada no calabouço da Inquisição, no Rossio. Ficou até 17 de Fevereiro de 1798, tendo ido depois para o Real Hospício das Necessidades. Durante este longo período de detenção, Bocage mudou o seu comportamento e começou a trabalhar seriamente como redactor e tradutor. Só saiu em liberdade no último dia de 1798. De 1799 a 1801 trabalhou sobretudo com Frei José Mariano da Conceição Veloso, um frade brasileiro, politicamente bem situado e nas boas graças de Pina Manique. A partir de 1801, até à morte em 1805, viveu em casa por ele arrendada no Bairro Alto, naquela que é hoje o n.º 25 da travessa André Valente.

Começou por militar no movimento literário denominado Arcádia. Os árcades eram poetas refinados, convencionais. Mais tarde, adere à Nova Arcádia. Mas depressa se zangou com os novos confrades. Em 1791, publicou o primeiro livro de rimas. Bocage tinha uma grande obsessão por Camões, procurando imitá-lo:

Camões, grande Camões, quão semelhante
Acho teu fado ao meu, quando os cotejo!
Igual causa nos fez, perdendo o Tejo,
Arrostar co' o sacrílego gigante;

Como tu, junto ao Ganges sussurrante,
Da penúria cruel no horror me vejo;
Como tu, gostos vãos, que em vão desejo,
Também carpindo estou, saudoso amante.

Ludíbrio, como tu, da Sorte dura
Meu fim demando ao Céu, pela certeza
De que só terei paz na sepultura.

Modelo meu tu és, mas... oh, tristeza!...
Se te imito nos transes da Ventura,
Não te imito nos dons da Natureza.


Aponta as semelhanças (o mesmo fado, a partida de Lisboa provocada por motivos parecidos, o encontro com o Adamastor, a estada e a miséria na Índia, as saudades da amada, o ludíbrio da sorte), mas reconhece, a final, que não tem o talento de Camões ("não te imito nos dons da natureza").

Bocage afirmou-se um seguidor de Camões: imitou-o na vida, entre Lisboa e a Índia, mas não conseguiu imitá-lo na capacidade de poetar.

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