terça-feira, 29 de janeiro de 2013

O teu Rosto Será o Último


Ontem, no Frente-a-Frente da Sic Notícias, os dois convidados apresentaram, no seu primeiro minuto, sugestão de livros. João Soares sugeriu a leitura de “Portugueses das Sete Partidas”, de Aquilino Ribeiro, e José Eduardo Martins sugeriu a leitura de “A Teoria Geral do Esquecimento”, de José Eduardo Agualusa, e “O teu Rosto Será o Último”, de João Ricardo Pedro, tendo feito um rasgado elogio a este último. 

O teu Rosto Será o Último” vai na 8º Edição e, para quem ainda não leu, recomenda-se. Em minha modesta opinião, por 3 razões: A primeira, e mais importante, é um bom livro, galardoado com um prémio de prestígio para um escritor jovem; segunda, é um escritor com laços familiares ligados à aldeia onde eu nasci; terceira, grande parte da narrativa passa-se, justamente, nessa terra (aldeia com nome de mamífero na vertente sul da Serra da Gardunha). Se não leu ainda, de que está à espera?

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Da minha língua vê-se o mar


Se fosse vivo, o escritor Vergílio Ferreira faria hoje 97 anos. Nasceu a 28 de Janeiro de 1916, em Melo, concelho de Gouveia, na região da Serra da Estrela. 

«Da minha língua vê-se o mar» – disse ele durante o discurso que proferiu na cerimónia da entrega do Prémio Europália de Literatura, em Bruxelas, no Palácio das Academias, no dia 9 de Outubro de 1991. 

Vergílio Ferreira é um daqueles escritores de que se pode dizer que escreveu sempre o mesmo livro, excepto as primeiras obras, em que ele é ainda influenciado pelo neo-realismo. Essa influência do marxismo no neo-realismo, ele abandona-a e afasta-se também do Catolicismo ou, pelo menos, entra numa relação de conflito com Deus, como Torga. O ressentimento de que Deus não esteja lá, de que Deus esteja ausente. A sensação de solidão do ser humano num universo que não tem sentido, que perdeu o sentido. Por outro lado, uma espécie de grande desafio a Deus, tentando colocar-se no lugar dele, competindo com ele. 

Num desses momentos dramáticos de conflito com Deus, Vergílio Ferreira escreveu assim:

Deus
Precisava bem de ter uma conversa a sério contigo,
se tu não tivesses tido a cobardia de existires.
Mas safaste-te, não exististe e agora?
Para aqui sem te poder pedir satisfações
e atirar-te à cara com umas tantas questões urgentes
e algum cuspo que viesse atrás
Se tivesses um pouco de vergonha,
existias mesmo para aguentar com dignidade
o que todos temos para te dizer,
eu, particularmente.
Mas és assim, sem espinha dorsal
e cavaste para onde é o não ser.
Porque eu queria que me dissesses aqui sem tergiversares
para que é que fizeste esta merda.
E não me venhas com o palanfrório da eternidade e o mais
que não adianta.
Olha agora a gente a aturar os anjinhos e os seus alaúdes
como se isso não fosse mais chatice
do que a chatice que querias compensar.
Não, a coisa é mais séria,
A coisa é que me puseste aqui sem me dares cavaco
e eu que aguente.
A coisa é que és pior que os antigos senhores
com os seus caprichos que metiam sangue, torturas
e outros passatempos
de quem está farto e não sabe como distrair-se.
Estavas chateado?
Fizeste a criação por não teres que fazer?
Mas não vale a pena adiantar mais conversa.
És assim
um tipo invertebrado
sem um mínimo de vergonha,
e com tipos assim não gosto de conversar.
Se não és o cobarde que te digo na cara que és,
então existe mesmo, existe,
que depois sim, a gente vai ter a sério
uma conversa de homens como deve ser.
Até lá, metes-me náusea e não quero ouvir sequer falar
de ti,
sequer ouvir,
sequer ouvir.... 


Vergílio Ferreira, 20 de Janeiro de 1980, in Conta-Corrente 3

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Raios partam os reles aldrabões da Internet


Há alguns meses, calhei a ver o programa “Querido, mudei a casa!” da SICMulher, em que uma equipa de decoradores modifica o interior de uma casa, após prévia candidatura dos interessados. 

Nesse programa, a operação incidiu sobre a sala da casa de uma senhora, que, se bem me lembro, vivia sozinha. No final, o decorador entendeu por bem deixar escrito na parede uma frase que seria uma homenagem dos familiares àquela senhora muito especial para eles. A frase era “O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis." Por baixo, como seu autor, o nome Fernando Pessoa. A frase ocupava grande parte da parede, em lugar de destaque. 

Enviei um email à equipa de produção do programa e, ao mesmo tempo, tive o cuidado de interpelar a Casa Fernando Pessoa no sentido de confirmar ou não a atribuição da frase ao poeta da Mensagem. Como esperava, a resposta foi no sentido de informar que a frase não constava da obra do poeta. Enviei novo email para a produção do dito programa, agora respaldado na informação da Casa Fernando Pessoa. Nunca me responderam. Desconheço se a simpática senhora continua com a tal frase na parede.

Desta vez, foi a RTP 1 a cair em pecado. O novo programa “Praça da Alegria”, agora produzido em Lisboa, tem novos cenários e, reparei, tem bem escarrapachada num mural a tal frase. 

O nosso poeta, coitado, deve dar voltas no túmulo lá no Mosteiro dos Jerónimos, ao ver tantas falsidades que circulam na NET. Raios partam os reles aldrabões da Internet!

Liguei hoje para a RTP e falei com um dos produtores do programa. Prometeu ir analisar o assunto. Sugeri que, se tiver dúvidas, sempre poderá consultar a Casa Fernando Pessoa. Vamos ver…

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

O navio que foi salvo no último dia


A RTP-Memória passa actualmente episódios da série “Horizontes da Memória”, da autoria do Prof. José Hermano Saraiva. Sempre que posso, vejo. O Prof. Hermano Saraiva é uma figura controversa, a que não é alheia a circunstância de ter sido Ministro antes do 25 de Abril. Por outro lado, foi muito criticado pelos seus confrades, por, às vezes, ter uma interpretação da História fora do cânone oficial. Aqui, devo dizer que ele, sempre que tinha uma versão diferente, deixava o aviso. Era só a sua opinião. Não podemos condenar ninguém por pensar pela sua cabeça. Cabe a nós aceitar ou não. E até pode ser um estímulo para irmos saber quem tem razão. 

No programa de hoje o Prof. falou do Navio Gil Eanes. O nome é uma justa homenagem ao navegador Gil Eanes, natural do Algarve. Ficou na História por ter sido o primeiro a navegar para além do Cabo Bojador em 1434. O primeiro navio era alemão e veio à posse de Portugal em 1916, a título indemnizatório. A segunda “versão” do navio é de 1955. O antigo foi substituído por uma nova embarcação, homónima, construída de raiz nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo. Ao longo da sua existência, o navio teve múltiplas funções, mas ficou mais conhecido como o navio-hospital português. O escritor Bernardo Santareno foi lá médico. O navio efectuou a sua última viagem à Terra Nova em 1973, ano em que também fez uma viagem diplomática ao Brasil com o recém-nomeado embaixador de Portugal em Brasília de então, o Prof. José Hermano Saraiva. Depois, ainda em 1975, o navio trouxe retornados de Luanda para Lisboa. Após esta última viagem perdeu as suas funções, ficando acostado no porto de Lisboa até ser vendido como sucata para abate em 1977. E, em consequência disso, o Gil Eanes entrou na Doca da Sucata de Alhos Vedros, para ser desmantelado. 

O programa de hoje foi filmado em Setembro de 1997, dentro do navio acostado na Doca da Sucata de Alhos Vedros, quando faltavam, justamente, 2 dias para se iniciar o seu desmantelamento. É, então, que o Prof. lança um apelo emotivo para salvar o navio do camartelo. Quando o programa chegou ao fim, não deixei de me sorrir, não acreditando que o navio, que mais parecia um monte de ruínas, se tivesse salvado. 

Só por curiosidade vim directo à NET só para confirmar o triste fim. Não, o navio não morreu ali. Como vem dito na Wikipédia “A comunidade vianense mobilizou-se para o resgatar, concebendo um projecto para ser exposto no porto de mar de Viana do Castelo, como tributo ao passado marítimo da cidade, tornando-se numa das suas atracções turísticas. Hoje, O Gil Eanes está ancorado no porto de pesca de Viana do Castelo, tem a função de espaço museológico e Pousada da Juventude”. 

Como também vem ali referido, foi graças ao apelo do Prof. José Hermano Saraiva que o navio Gil Eanes foi salvo do camartelo. Mais vale tarde do que nunca!

domingo, 20 de janeiro de 2013

O poema que perdeu o primeiro verso


Mais um desafio para os meus amigos. Tenho este poema da Sophia, mas acontece que perdi o primeiro verso.  

(…)
Os instantes que não vivi junto do mar
De todos os cantos do mundo
Amo com um amor mais forte e mais profundo
Aquela praia extasiada e nua
Onde me uni ao mar, ao vento e à lua.
 
Sophia de Mello Breyner, in Mar

Não desanimem, amigos. A resolução deste problema de Palavras Cruzadas dá-nos a conhecer esse primeiro verso (6 palavras). Diverte-te. No final, poderás deliciar-te com um lindo poema da Sophia!


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HORIZONTAIS: 1 - Arqueai; Prefiram. 2 – Conjunção que significa sempre que; Deserto. 3 – Uno; Quadro; Área Protegida Regional (sigla). 4 – Preposição que introduz expressões que designam ausência, falta, privação ou exclusão; Despachar. 5 – Abismo (figurado); Decore. 6 – Bário (símbolo químico); Uniforme; Atmosfera. 7 – Gordura; Possuir. 8 – Acto de serrar; A parte mais larga dos membros dianteiros das reses (plural). 9 - Manifestação do apetite sexual, nos animais, nas épocas próprias da reprodução; Luz da Lua; A minha pessoa. 10 – Altar cristão (plural); Conjunto de partículas granulosas de natureza mineral, que se encontra no leito dos rios, dos mares, nas praias e nos desertos (plural). 11 – Braços; Gemera. 

VERTICAIS: 1 – Neste lugar; Procurar. 2 - Aguardente obtida da destilação do melaço depois de fermentado; Jeito. 3 – Entre nós; Sociedade anónima (sigla); Ribombam. 4 - Antecedente; Único. 5 – A mesma coisa; O mais (antiquado). 6 – Sufixo nominal que traduz a ideia de semelhança ou origem; Exclamação usada, de modo ríspido, para mandar alguém embora; Ultravioleta (sigla). 7 – Alcoólicos anónimos (sigla); Estaciona. 8 – Raiz; Regressarei. 9 - Atraiçoar; Estás; Andava. 10 – Esconder; European Agency for Reconstruction (sigla). 11 – Desaparecer; Génio ou entidade inspiradora de um poeta.

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sábado, 19 de janeiro de 2013

Ler a poesia de Eugénio de Andrade

Se fosse vivo, Eugénio de Andrade faria hoje 90 anos. Nasceu na Póvoa de Atalaia, concelho do Fundão. Por pouco, não nasceu na aldeia em que eu nasci.

Ler a poesia de Eugénio de Andrade é passar a alma por água limpa. 

Deixo aqui a minha pequena homenagem ao poeta da imagem. “Um pássaro nascia dos seus dedos/e deslumbrado penetrava nos espaços”.



quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Longo foi o caminho



Miguel Torga morreu no dia 17 de Janeiro de 1995. Há 18 anos, portanto. “Longo foi o caminho e desmedidos os sonhos que nele tive”, diz o poeta no último poema que escreveu para o Diário, no dia 10 de Dezembro de 1993. 

Requiem por mim

Aproxima-se o fim.
E tenho pena de acabar assim,
Em vez de natureza consumada,
Ruína humana.
Inválido do corpo
E tolhido da alma.
Morto em todos os órgãos e sentidos.
Longo foi o caminho e desmedidos
Os sonhos que nele tive.
Mas ninguém vive
Contra as leis do destino.
E o destino não quis
Que eu me cumprisse como porfiei,
E caísse de pé, num desafio.
Rio feliz a ir de encontro ao mar
Desaguar,
E, em largo oceano, eternizar
O seu esplendor torrencial de rio.

Miguel Torga, Coimbra, 10 de Dezembro de 1993, in DiárioXVI

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

O humor fino de Luís de Camões


Há uma faceta do poeta Luís de Camões que, não digo ignorada, é pouco falada. Refiro-me ao seu sentido de humor e ironia, que é bem patente em pequenos poemas. O poeta épico tem, são bem conhecidos, alguns pequenos poemas em que se reflecte um tom muito divertido e bem-humorado. Conta-se que um fidalgo de Cascais, D. António de Castro, encomendou uns versos ao nosso poeta em troca de 6 galinhas. Entregue a encomenda, o fidalgo apenas mandou entregar ao poeta meia galinha. Camões não se conteve e respondeu com esta quadra: 

Cinco galinhas e meia 
Deve o senhor de Cascais; 
E a meia vinha cheia 
De apetite para as mais.

Uma galinha no séc. XVI deveria ser uma iguaria deveras apreciada, acreditando no ditado popular que chegou aos nossos dias: "Quando o pobre come galinha, um dos dois está doente". Só assim se compreende a resposta do poeta, carregada de tanta ironia. 

domingo, 13 de janeiro de 2013

Palavras Cruzadas com História

Um problema de Palavras Cruzadas inspirado na exposição "As Idades do Mar" que agora terminou na Gulbenkian, onde esteve aberta ao público desde 26 de Outubro de 2012.

Palavras Cruzadas com um desafio. No final, encontrará, na diagonal, o nome de um pintor português que esteve presente na exposição.
 
 
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HORIZONTAIS: 1 – Minar; Alisa. 2 – Empunhar; Que edita. 3 – Singular; Sucedi; Região Demarcada do Douro (sigla). 4 – Tomba no calçado; Nova Ordem Económica Internacional (sigla). 5 – Anel; Tumor benigno do tecido muscular. 6 – Pseudónimo da pintora portuguesa Maria Inês Carmo Ribeiro da Fonseca (1926-1995), presente na Exposição “As Idades do Mar”. 7 – Festa comemorativa da entrada de Jesus Cristo em Jerusalém; Entregai. 8 – Aniversário de nascimento; (…) David Friedrich (1774-1840), pintor alemão, presente na Exposição “As Idades do Mar”. 9Instituto dos Arquivos Nacionais (sigla); Prefixo que exprime a ideia de posteridade, no tempo ou no espaço; Prótese Total da Anca (sigla). 10 – Maria Helena (…) da Silva (1908-1992), pintora portuguesa, presente na Exposição “As Idades do Mar”; Produzi (figurado). 11 – Nome comum a todos os corpos celestes; Violentos.

VERTICAIS: 1 – Elemento de formação de palavras que exprime a ideia lagarto; Ódio. 2 – Ignorante; Comuns. 3 – Pio das aves; Claude (…), pintor francês (1840-1926), presente na Exposição “As Idades do Mar”. 4 - Atmosfera; Isolados; Seguir. 5 - Azebre; Vantagem. 6 – Eternidade; Filtra. 7 – Acrescentei; Montões. 8Conselho de Imprensa (sigla); Espécie de casaco curto (pl.); Raiz. 9 – Estrondo; Instituto Português do Património Arquitectónico. 10 – Dispositivo electrónico que serve para ligar um terminal ou um computador a uma linha de telecomunicação; Escuro. 11 – Estava muito quente; Solicitais.

Clique Aqui para imprimir. Divirta-se.