"Junto de um seco, fero e estéril monte" é o verso de um poema, a célebre Canção IX, do poeta Luís de Camões, pedido com a resolução do passatempo do mês de Junho.
O nosso genial poeta, longe da pátria, escreveu este poema, onde recorda, com emoção e saudade, as figuras que amava e teve de abandonar.
Canção IX
Junto de um seco, fero e
estéril monte,
inútil e despido, calvo,
informe,
da natureza em tudo
aborrecido,
onde nem ave voa, ou fera
dorme,
nem rio claro corre, ou
ferve fonte,
nem verde ramo faz doce
ruído;
cujo nome, do vulgo
introduzido,
é Félix, por antífrase,
infelice;
o qual a Natureza
situou junto à parte
onde um braço de mar alto
reparte
Abássia da arábica aspereza,
onde fundada já foi
Berenice,
ficando à parte donde
o Sol que nele ferve se lhe
esconde;
nele aparece o Cabo com que
a costa
Africana, que vem do Austro
correndo,
limite faz, Arómata chamado
(Arómata outro tempo; que,
volvendo
os céus, a ruda língua mal
composta
dos próprios outro nome lhe
tem dado).
Aqui, no mar que quer
apressurado
entrar pela garganta deste
braço,
me trouxe um tempo e teve
minha fera ventura.
Aqui, nesta remota, áspera e
dura
parte do mundo, quis que a
vida breve
também de si deixasse um
breve espaço,
por que ficasse a vida
pelo mundo em pedaços
repartida.
Aqui me achei gastando uns
tristes dias,
tristes, forçados, maus e
solitários,
trabalhosos, de dor e de ira
cheios,
não tendo tão-somente por
contrários
a vida, o sal ardente e
águas frias,
os ares grossos, férvidos e
feios;
mas os meus pensamentos, que
são meios
para enganar a própria
Natureza,
também vi contra mi,
trazendo-me à memória
algũa já passada e breve
glória,
que eu já no mundo vi,
quando vivi,
por me dobrar dos males a
aspereza,
por me mostrar que havia
no mundo muitas horas de
alegria.
Aqui estive eu co estes
pensamentos
gastando o tempo e a vida;
os quais tão alto
me subiam nas asas que caía
— e vede se seria leve o
salto! —
de sonhados e vãos
contentamentos
em desesperação de ver um
dia.
Aqui o imaginar se convertia
num súbito chorar e nuns
suspiros,
que rompiam os ares.
Aqui, a alma cativa,
chagada toda, estava em
carne viva,
de dores rodeada e de
pesares,
desamparada e descoberta aos
tiros
da soberba Fortuna:
soberba, inexorável e
importuna.
Não tinha parte donde se
deitasse,
nem esperança algũa onde a
cabeça
um pouco reclinasse, por
descanso.
Todo lhe é dor e causa que
padeça,
mas que pereça não, por que
passasse
o que quis o Destino nunca manso.
Oh! que este irado mar,
gritando, amanso!
Estes ventos da voz
importunados,
parece que se enfreiam!
Somente o Céu severo,
as Estrelas e o Fado sempre
fero
com meu perpétuo dano se
recreiam,
mostrando-se potentes e
indignados
contra um corpo terreno,
bicho da terra vil e tão
pequeno.
Se de tantos trabalhos só
tirasse
saber inda por certo que
algũa hora
lembrava a uns claros olhos
que já vi;
e se esta triste voz,
rompendo fora,
as orelhas angélicas tocasse
daquela em cujo riso já
vivi;
a qual, tornada um pouco
sobre si,
revolvendo na mente
pressurosa
os tempos já passados
de meus doces errores,
de meus suaves males e
furores,
por ela padecidos e
buscados,
tornada — inda que tarde —
piadosa,
um pouco lhe pesasse
e consigo por dura se
julgasse;
isto só que soubesse, me
seria
descanso para a vida que me
fica;
co isto afagaria o
sofrimento.
Ah! Senhora, Senhora, que
tão rica
estais que, cá tão longe, de
alegria
me sustentais cum doce
fingimento!
Em vos afigurando o
pensamento,
foge todo o trabalho e toda
a pena.
Só com vossas lembranças
me acho seguro e forte
contra o rosto feroz da fera
Morte,
e logo se me ajuntam
esperanças
com que a fronte, tornada
mais serena,
torna os tormentos graves
em saudades brandas e
suaves.
Aqui co eles fico,
perguntando
aos ventos amorosos, que
respiram
da parte donde estais, por
vós, Senhora;
às aves que ali voam, se vos
viram,
que fazíeis, que estáveis
praticando,
onde, como, com quem, que
dia e que hora.
Ali a vida cansada, que
melhora,
toma novos espritos, com que
vença
a Fortuna e Trabalho,
só por tornar a ver-vos,
só por ir a servir-vos e querer-vos.
Diz-me o Tempo que a tudo
dará talho;
mas o Desejo ardente, que
detença
nunca sofreu, sem tento
me abre as chagas de novo ao
sofrimento.
Assi vivo; e se alguém te
perguntasse,
Canção, como não mouro,
podes-lhe responder que
porque mouro.
Luís de Camões
Esta é a solução completa do problema:
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Respostas de: Aleme; Anjerod; António Amaro; Antoques; Arjacasa; Bábita; Baby; Caba; Corsário; El-Nunes; Elvira Silva; Filomena Alves; Fumega; Homotaganus; Horácio; Jani; João Alberto Bentes; João Carlos Rodrigues; João Nabais; Joaquim Pombo; José Bento; José Bernardo; José Mendes Grilo; Lurdes Polido; Mafirevi; Magno; Manuel Amaro; Manuel Carrancha; Manuel Ramos; Mister Miguel; Olidino; Osair Kiesling; Paulo Freixinho; Raquel Atalaya; Ricardo Campos; Rui Gazela; Russo; Salete Saraiva e Virgílio Atalaya.
Vemo-nos por aqui! Até Breve(Alegria)!
Eis na lista dos solucionistas, felizmente cada vez mais longa, uma boa série de futuros novos charadistas...
ResponderEliminarCaro Grifo, grato pelo comentário. Não tenho a honra de o conhecer, mas, como tenho em mãos os "Ecos de Braga", vejo que é também charadista. Como sou novato nestas andanças, não me atrevo a tratá-lo por confrade. Muito me honraria a sua participação em passatempos futuros. Abraço.
EliminarCaro amigo Grifo, como já referi no comentário anterior, muito me honraria a sua participação nos passatempos de palavras-cruzadas publicadas sempre no primeiro dia do mês neste AlegriaBreve. Pode enviar, se estiver interessado, para algum dos endereços que vêm indicados ou, ainda, para a seguinte morada: Rua Dr. Francisco Ribeiro Spínola, Lote 72, 4ª, Massamá, 2745-872 QUELUZ. Abraço. Joaquim Boavida
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