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domingo, 10 de maio de 2015

A Acácia do Jorge


Na passada 6ª Feira, peregrinei, com os meus amigos dos livros, até São Miguel de Seide, à procura de Camilo na casa onde viveu os últimos anos da sua vida. Regressei, confesso, um pouco dividido.

Com a alma cheia, porque a visita à Casa de Camilo correu bem. Valeu, sobretudo, pela forma como a casa foi mostrada aos viajantes. Apresentação competente, sábia, muito cuidada (ao mínimo pormenor), citação de cor de partes de poemas e de prosa, pincelada de humor que ajudou a manter os visitantes interessados. Estive a rever o que José Saramago descreveu em “Viagem a Portugal” na visita que fez à Casa de Camilo, em 1980. Não gostou e, no final, escreveu «Ceide não comove, entristece». Não sou da mesma opinião. 

Com a alma vazia, porque não pousei os olhos sobre o célebre comentário que Camilo escreveu a lápis n´"A Relíquia" do Eça de Queirós. Era um dos meus propósitos, desde há alguns anos. Camilo fez uma anotação nada simpática. Miguel Torga em "Portugal" chamou ao comentário um anátema. Escreveu Camilo: «Este livro tem duas partes: a primeira, é uma porcaria; a segunda: uma maçada. Uma xaropada hiperbólica, inenarrável…falta de bom senso e bom gosto». Crítica injusta, porque não disse que o livro está muitíssimo bem escrito. Pela minha parte, perdi esta oportunidade. Não sei se algum dia lá voltarei.

Em primeiro plano da fotografia, a célebre acácia do Jorge (o filho louco). O escritor, que sofreu muito com a doença do filho, grita alto a sua dor neste poema:


Durante a febre

À porta do sepulcro, ainda volto a face
Para ver-te chorar, ó mãe do filho amado,
Que vê, como num sonho, a cena do trespasse…
– Solver-lhe o eterno abismo o pai idolatrado.

Talvez que ele, a sonhar, te diga: «Mãe não chore
Que o pai há-de voltar…» Quem sabe se virei?
Quando a Acácia do Jorge ainda outra vez inflore,
Chamai-me, que eu de Abril nas auras voltarei.

Camilo Castelo Branco

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