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domingo, 24 de março de 2019

A rua da Sofia em Coimbra

Tal como Sophia, Jorge de Sena faria 100 anos em 2019. Sendo total merecidas as homenagens a Sophia, que estão sucedendo no país, parece-me que Jorge de Sena está a ser esquecido. 

Mas a obra de Jorge de Sena fala por si. Compreende mais de vinte colectâneas de poesia, uma tragédia em verso, uma dezena de peças em um acto, mais de trinta contos, uma novela e um romance, e cerca de quarenta volumes dedicados à crítica e ao ensaio (com destaque para os estudos sobre Camões e Pessoa, poetas com os quais a sua poesia estabelece um importante diálogo), à história e à teoria literária e cultural, ao teatro, ao cinema e às artes plásticas.

Jorge de Sena, no final de vida, zangou-se muito com Portugal, não ficou calado e muitos, talvez, não lhe perdoam. E por vezes, foi muito ácido nas apreciações que fez sobre o país que o viu nascer. Um exemplo.

Escreveu sobre a Sofia um poema satírico inserto no livro "Dedicácias". Não a poeta Sophia, sua grande amiga, com quem ele manteve correspondência. Mas sobre a rua da Sofia em Coimbra. O poeta refere a Rua da Sofia como símbolo do provincianismo cultural português. Sem margem para dúvidas, reza assim:


Rua de Sofia em Coimbra

Sabe de Hegel, de Sartre, de fenomenologia
mas andou na Rua da Sofia.

É inteligente, arguto, viajado
mas vive sempre com a aldeia ao lado.

Que há nestes portugueses que é como um sarro azedo,
um cheiro de vinagre ou carrascão de medo,
a que se agarram quais lapas ao Penedo

da Saudade? Não há filosofia
que salve quem andou na Rua da Sofia.

Jorge de Sena, │ Dedicácias


Nos últimos 4 anos visitei a cidade por duas vezes e, com pena, tenho de concordar com o poeta. Por inércia municipal, Coimbra tem estado a andar para trás, cada vez mais provinciana. Tenho a certeza que se o poeta voltasse agora a Coimbra, não alterava uma vírgula ao que escreveu. É pena.

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