Viagens na Minha Terra junta vários estilos literários no relato de uma viagem de Lisboa a Santarém. Muito mais que uma crónica de viagens, que um romance sobre a Menina dos Rouxinóis, ou a Menina dos Olhos Verdes, ou sobre as amores entre Joaninha e o Carlos, VMT é sobretudo uma reflexão sobre Portugal e, sem dúvida, um marco na literatura portuguesa
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(texto adaptado de Grandes Livros - Viagens na Minha Terra - Série RTP)
“Que viaje à volta do seu quarto quem está à beira dos Alpes, de Inverno…mas com este clima, com este ar que Deus nos deu…o próprio Xavier de Maistre, que aqui escrevesse, ao menos ia até ao quintal” - pp 39
Ao abrir VMT, preparámo-nos para uma longa jornada, com múltiplos destinos e peripécias. Mas, ao fim de poucas linhas, esbarramos numa desilusão.
“Foi sempre ambiciosa a minha pena: pobre e soberba, quer assunto mais largo. Pois hei-de dar-lho. Vou nada menos que a Santarém” - pp 39
Pelo meio, Garrett há-de parar em VN da Rainha, Azambuja e Cartaxo. Mas é só esta a viagem na minha terra? Estes quase 80 Km que hoje seriam percorridos numa hora, que diria um Camões ou um Fernao Mendes Pinto, perdidos nos confins da Ásia? No entanto, neste percurso pouco audaz, aparecerão frades e barões, D. Quixote e Sancho Pança, ecos de Napoleão e do Imperador do Brasil e até uma Guerra Civil. Mas como cabe tudo isto neste pequeno roteiro? Que livro vem a ser afinal VMT?
“São 17 deste mês de Julho, ano da graça de 1843,... Seis horas da manhã a dar em São Paulo e eu a caminhar para o Terreiro do Paço” – pp 40
Diz Carlos Reis: “A viagem que está na VMT parece curta mas não tão curta como parece. É uma viagem a Santarém, uma viagem a Santarém, naquela época, demorava bem mais do que hoje, fazia-se em parte de barco, fazia-se em parte em dorso de animal, era assim naquela época, fazia-se também caminhando, portanto demorava algum tempo”
Diz Tiago Salazar: “Ainda não havia comboio, portanto a viagem fez-se de várias maneiras, entre elas de mula. Agrada-me essa ideia, acho que se deveria fazer uma viagem até ao Vale de Santarém de mula, para ver como é, para ver se chegávamos lá vivos.”
Sejam então bem-vindos a bordo deste livro peculiar, apresentado como romance, crónica de viagem e muito mais. Estamos em meados do sec. XIX e um amigo convidou AG e outros amigos, companheiros, a visitá-lo em Santarém. Mas, tratando-se uma viagem apenas, por que se intitulará Viagens?
Diz Ofélia Paiva Monteiro: “Título da obra foi sempre Viagens (no plural) na Minha Terra, quando há um passeio a Santarém, que foi real, Garrett foi realmente a Santarém, de Lisboa a Santarém. A convite de Passos Manuel".
“Ora nesta minha viagem Tejo-arriba está simbolizada a marcha do nosso progresso social” – pp 46
A marcha do progresso nacional, diz Garrett, acontece pelo embate de dois princípios: o espiritualista e o materialista. Um, tem porta-voz em D. Quixote; o outro, no seu anafado companheiro Sancho Pança. Um, paira sobre a vida terrena através das suas teorias abstratas; o outro, segue de olhos postos no chão, considerando utopia tudo quanto sai da boca do seu senhor.
Quando Garrett e os companheiros chegam à primeira paragem em VN da Rainha, o mistério da obra já começa a desvelar-se.
Diz Carlos Reis: “A digressão é um trajecto físico, evidentemente, mas a digressão é sobretudo um trajecto mental: o trajecto da reflexão, o trajecto da indagação, o trajecto da ficção (porque, durante a viagem, contam-se histórias, em particular uma história), um trajecto pela História de Portugal, um trajecto pela Filosofia Contemporânea”.
VMT não está no plural por acaso, e muito menos consiste num banal percurso entre lisboa e Santarém, por mais tumultuoso que fosse, há 150 anos. As viagens são jornadas mentais e sentimentais, reflexões e críticas, o pensamento livre de um grande conhecedor do seu tempo, a reboque da viagem por pedaços simbólicos dum país a habitar as ruínas do que foi.
Diz Helena Buescu: “Penso que essa definição do que foi e do que poderia ter sido é uma definição interessante justamente das viagens não tanto já do que foi ou do que poderia ter sido”.
Diz Ofélia Paiva Monteiro: “Quando ele, na sua pequena viagem a Santarém, chega ao pinhal da Azambuja, o pinhal da Azambuja já não é um grande pinhal, são uns pinheiritos enfezados, quando chega a um café local, é um cafezito, onde as moscas poluem os copos”.
Diz Murilo Carvalho: “É um profundo desencanto ao chegar às construções de Santarém e encontrá-las naquele estado que ele encontrou. Quando ele vai penetrar no grande castelo que foi do rei D. Afonso Henrique, que foi a força de Portugal, fizeram no muro uma portinha, que ele tem de se baixar para entrar e sair numa horta de couves. Quer dizer, o símbolo dessas construções decaídas é muito grande em relação a Portugal!"
Almeida Garrett viaja também na erudição, vai citando Goethe, Shiller, Vitor Hugo, Byron e outros…para desmontar a ilusão de um progresso que se compraz consigo no seu movimento próprio, no seu movimento mecânico, destituído de ideais.
“Não: plantai batatas, ó geração de vapor e pó de pedra, macadamizai estradas, fazei caminhos de ferro, construí passarolas de Ícaro...comprai, vendei, agiotai - no fim de tudo isto, o que lucrou a espécie humana?” - pp 51.
Enquanto critica a decadência que um certo progresso foi semeando pelo caminho, Almeida Garrett vai avançando da Azambuja ao Cartaxo. De permeio critica fórmulas literárias, fala das virtudes das jovens moças, faz um elogio de Camões e teoriza como a Inglaterra perdeu toda a força quando trocou o Vinho do Porto pelas zurrapas de Bordéus. Mas sempre com o dedo apontado à contradição que faz o mundo andar o idealista D. Quixote e o mundano Sancho. Mas a vitória de Sancho Pança sobre o seu amo no mundo e em Portugal, levanta uma pergunta, uma pergunta tão válida em 1834 como em 2009 ou, ainda, em 2017.
Diz José Miguel Sardica: “E a pergunta que essa continuidade encerra é: o que é que falta? ou seja, o país tem uma série de indicadores de desenvolvimento, hoje medem-se em indicadores económicos, é o PIB, é a OCDE, são todos os indicadores que dizem que somos um país desenvolvido, pertencemos à Europa desenvolvida, mas sentimos, o século XX já sentiu, Garrett já sentia que nos faltava alguma coisa”.
“Benévolo e paciente leitor, o que eu tenho decerto ainda é consciência, um resto de consciência: acabemos com estas digressões e perenais divagações minhas” – pp 87.
Diz Carlos Reis: “Hoje, nós podemos ler as VMT como uma espécie de relato de todos os relatos, de invenção do relato, de invenção da narrativa, como a forma verbal, que fala de nós, que fala da nossa vida, que fala do país, que fala da nossa Cultura, que fala do nosso espaço, que fala dos nossos dramas”.
As Viagens, no entanto, não seriam uma pedrada no charco oitocentista apenas por falar de tudo daquilo que falam, mas também pela forma inovadora de falar de tudo e de quem falam.
Diz Jacinto Lucas Pires: “Há um momento, se bem me lembro, espero não estar a falhar a referência, um momento em que o narrador diz, «leitor deixei-te parado aí, mas agora voltamos, segue agora outra vez o caminho connosco», é quase como uma ideia de cinema, voltar àquele plano, trazer outra vez a câmara e o espectador”.
“Bem vejo que te deixei parado à minha espera no meio da ponte da Asseca. Perdoa-me por quem és, dêmos de espora às mulinhas, e vamos que são horas” – pp 87.
Diz Ofélia Paiva Monteiro: “Ele desfaz o tom literário, ele não quer a literatice, e, por consequência, procura efectivamente - isso que é muito moderno, fazer aceder à Literatura a linguagem coloquial, a linguagem de todos os dias, inclusive em níveis que não tinham muito direito a serem considerados níveis sérios".
AG é tradicionalmente o porta-estandarte do romantismo literário português, mas VMT prova que é mais que isso.
Diz Carlos Dias: “Garrett é o criador da Língua literária portuguesa moderna, escrevia-se de uma maneira AG, passou-se a escrever de outra forma DG".
“Passámos a igreja da Alcáçova, que achamos já fechada; e tomando sempre sobre a esquerda, fomos pelo que hoje parece uma azinhaga de entre quintas, mas que visivelmente foi noutras eras a rua mais «faschionavel» desta vila cortesã” - pp. 210 e 211
Diz Ofélia Paiva Monteiro: E então, quando ele diz, por exemplo, que estávamos na rua mais faschionável de Santarém, é evidente que ele está a brincar, com o faschionável, ele adapta-o ao português e, quando diz que flirtou com não sei com quantas meninas, e com as inglesas, bom… ele vai, por conseguinte, em nome dum padrão de vida estrangeiro, por vezes metendo efeitos muito cómicos, irónicos ou humorísticos na nossa língua, alguns desses estrangeirismos".
“Pois amigo e benévolo leitor, eu nem em princípios nem em fins tenho escola a que esteja sujeito, e hei-de contar o caso como ele foi. Escuta” – pp 213
Por entre paisagens e divagações, Garrett chega ao Vale de Santarém, lugar primordial de inocência. De repente, revela-se uma vidraça à antiga por entre as árvores, com rouxinóis e um cortinado que revela o interior de uma casa. Um vulto enigmático vem à janela. É a menina dos rouxinóis, garante o amigo Garrett. Mas não é possível que ainda lá viva, acrescenta Garrett. Só pode tratar-se de um anjo. VMT prepara-se então para enredar mais o seu novelo de histórias. Quem seria a menina dos rouxinóis?
Almeida Garrett nasceu João Baptista da Silva Leitão no Porto, em 1799. Cresceu no seio de uma família burguesa que tem de fugir para os Açores para escapar às Invasões Francesas. Em Angra do Heroísmo, Garrett é educado pelo tio, o futuro Bispo da Diocese. Recebe uma formação clássica nas Letras e religiosa nos princípios. E a família chega a pensar que seguirá as pisadas do tio. Mas João Batista prefere estudar Leis em Coimbra. Aí, descobre uma ascendência aristocrática irlandesa e passa assim a assinar Almeida Garrett. Constrói uma figura sedutora, galanteadora, cuidadosa no vestir, bem-falante. E torna-se um orador notável, que se destaca entre os jovens intelectuais da Universidade.
Diz Ofélia Paiva Monteiro: “É ele o estudante, o caudilho académico, vai para a sala dos capelos declamar e aos deputados que estavam a lutar pelo triunfo da liberdade na Assembleia dos Deputados. Mas, é empenhadíssimo e correndo riscos.”
Diz Carlos Reis: “Ele não foi o único, nesse aspecto, mas é, sem dúvida, a figura que mais, emblematicamente, traduz no nosso sec. XIX essa ideia que o escritor é também um cidadão, empenhado, lutador, batendo-se por causas, e fazendo da Literatura, realmente, um espaço de afirmação social, cultural e até política”.
Diz Helena Buescu: “Ele é um grande orador. Ele é uma personagem com uma intervenção cívica, muitíssima importante, um político de primeira água, um politico decisivo, justamente até meados do sec. XIX. É uma figura de referência, em termos simbólicos também, enfim a sua figura mundana, como quase dandy, é também conhecida.”
Garrett dá os primeiros passos na Política, na Literatura e no Teatro, e, pouco depois de concluir o curso e se mudar para Lisboa, já vê estrear peças suas na capital. Numa noite em que o seu Catão está em cena, encanta-se por uma bela rapariga.
Diz Ofélia Paiva Monteiro: "Bem, eu acho que Garrett sonhou muito a mulher. E isso é perigoso sempre, quando o indivíduo se confronta com o ideal sonhado. Eu julgo que a primeira concretização dessa espécie de sonho eufórico da mulher foi a sua própria mulher, a única mulher legítima que ele teve, que ele conheceu adolescente, mesmo adolescente, 14 anos, quando terminou o seu curso de Direito em Coimbra, e com quem ele casou".
Meses depois, Almeida Garrett e Luísa Midosi casam. Uma relação atribulada, sentimental e, geograficamente, porque aquela figura que aparecera tão meteoricamente na vida portuguesa vai exilar-se em Inglaterra. Mas porquê? Aos 24 anos, porque fugia já Garrett pela 2ª vez à sua própria vida?
“À porta dessa casa entre o arvoredo, estava sentada uma velhinha….diante de si tinha uma dobadoira que se movia regularmente com o tirar do fio…a velha poisou tranquilamente as mãos e o novelo e chamou: Joaninha?... Aqui estou, minha avó, é a sua meada? E Joaninha veio com os braços abertos para a velha” – pp 95 e 96.
Voltemos à menina dos rouxinóis, por quem Garrett se enfeitiçou alguns minutos antes, a moça já tem nome. Joaninha. E assim que aparece, salta à vista a sua doçura, a bondade com que trata Francisca, a avó cega que doba a meada no silêncio do vale. Quem serão estas mulheres?
Diz Ofélia Paiva Monteiro: “A meu ver, Garrett fez de Joaninha o símbolo da natureza não poluída e, a meu ver, é a razão de ser poética para ela ter olhos verdes porque há todo um poema, um poema em prosa feito por Carlos aos olhos verdes, «Joaninha, Joaninha por que tens tu os olhos verdes? - pp 167 »".
Diz Murilo Carvalho: “A avó é aquele Portugal, sentado e cego, apaixonado pelos seus filhos, mas absolutamente incapaz de fazer qualquer coisa por eles, a não ser sofrer."
Garrett demora-se na contemplação de Joaninha, a beleza suave, a ingenuidade dos seus 16 anos, sabemos que vive sozinha com a avó, desde a partida de um outro neto, um Carlos que foi estudar para Coimbra, daí partiu para Inglaterra, e voltou a Portugal depois para se alistar num dos exércitos que se defrontavam então num violento combate. A velha Francisca sofre de desgostos e segredos que não confessa senão a um homem austero e ambíguo, que a visita todas as 6ªs Feiras, o Frei Dinis.
Diz Murilo Carvalho: “Na verdade, a personalidade forte e marcante é o Frei Dinis, porque ele é o sujeito que é o Bem e o Mal, é o retrato duplo do Bem e do Mal".
As aparições do frade resultam em momentos de tensão. Homem de posses, deixou um dia a vida terrena para vestir um hábito que se colocasse entre ele e as tentações. Nesse momento, deixou o seu dinheiro à velha Francisca e à jovem Joaninha. Mas por que o terá feito? Que o liga àquelas criaturas?
Diz Ofélia Paiva Monteiro: “Frade, bem, tal como o Garrett o mostra, Frei Dinis era de facto a personagem que não tinha compreendido que a sociedade tinha evoluído, tinha forçosamente que mudar a estrutura do Portugal velho”.
Francisca cegou de tanto chorar as sucessivas visitas da morte que lhe levou os pais de ambos os netos e, como se não bastasse, um dia, o próprio Carlos partiu, não para o outro mundo, para uma guerra que a velha mulher não compreendia. Por fim, tem de ouvir o seu confessor, Frei Dinis, amaldiçoar Carlos e essa sua tropa de inimigos de Deus.
“E pouco a pouco, os combates, as escaramuças, o som, a vista do fogo, o aspecto do sangue, os ais dos feridos, o semblante desfigurado dos mortos - a guerra enfim em todas as suas formas - se lhes tornou uma coisa familiar, ordinária...” pp143
Os exércitos aproximam-se do Vale, mas ambas as facções aprendem a respeitar os passeios diários de Joaninha, a menina dos rouxinóis, que, de tão evidentemente pura, se confundia com uma bandeira de paz. Certo dia, no entanto, Joaninha adormece entre as árvores, os soldados constitucionalistas deixam-na estar, mas o novo oficial, recém chegado naquele dia de Lisboa, aproxima-se.
“Joaninha estremeceu…Carlos, Carlos! - balbuciou ela, com os olhos ainda meio fechados, - Carlos, meu primo…meu irmão! – pp 151
Era então o desaparecido Carlos, o filho pródigo, que se alistara numa das frentes quem ali revelava. Que resultaria deste encontro inesperado? E, sobretudo, que guerra era esta afinal? Vamos por partes. Para compreender tudo, é necessário contar primeiro uma outra história.
Tudo começa com este homem, Napoleão Bonaparte invadiu Portugal em 1807, mas D. João VI, numa acção classificada algures entre a inteligência e a cobardia, foge para o Brasil com toda a família real. Vários anos e 3 tentativas falhadas depois, as tropas napoleónicas retiram. Portugal está a salvo, mas nada voltaria a ser como dantes. Os liberais vêm uma oportunidade única de fazer a revolução (1820) que muitos países haviam feito décadas antes. Contra a vontade da família, D. João VI regressa no ano seguinte, deixando o filho Pedro como regente dum Brasil que tem agora características autonómicas especiais. Os liberais só autorizam o desembarque do rei depois do fazer jurar a Constituição revolucionária. Mas os equilíbrios eram delicados. Pressionado pelos constitucionalistas a regressar e reduzir o Brasil à sua condição original de colónia, o Príncipe D. Pedro faz exactamente o oposto. Proclama a independência com o célebre Grito do Ipiranga e torna-se imperador do Brasil. O descontentamento aumenta em Portugal e na corte, e, em 1823, o irmão mais novo de D. Pedro, D. Miguel, conduz a Vila-Francada, um golpe de regresso ao Absolutismo, organizado em conspiração com a mãe, D. Carlota Joaquina. Percebemos agora a partida de Garrett para o exílio inglês. O Absolutismo, ainda mal tinha ido a enterrar, e já ressuscitava. E que acontece ao escritor desterrado? Uma nova mudança. Um ano depois, já em França, escrevia Camões e D. Branca, os poemas fundadores do romantismo português.
Diz Helena Buescu: “Basicamente, com a introdução dos poemas, ou com a publicação desses poemas, Camões e D. Branca, aliás fora do país, visto que Garrett estava ainda exilado, essa publicação permite, de algum modo, sistematizar algumas mudanças que na realidade se faziam sentir na Literatura Portuguesa já desde o sec. XVIII”
Diz Carlos Reis: “O Romantismo, evidentemente que a experiência no exílio foi para Almeida Garrett, como para Alexandre Herculano, mas, neste caso para Garrett, um veículo extremamente relevante para o conhecimento do romantismo e também para a vivência de certos mitos românticos, como este do poeta exilado, perseguido, solitário, saudoso da Pátria, etc…”
É aqui que tudo se cruza literatura e política, ficção e vida real. É difícil dizer onde começa uma e acaba outra. Vejamos. O romantismo nasce por oposição ao racionalismo do século anterior. Coloca o indivíduo no centro das atenções, o drama humano, o amor, a tragédia, o sonho, a morte, os desejos de fuga. Idealiza a mulher e persegue um absoluto no fundo inatingível. No caso português, os ideais utópicos do romantismo acabariam por coincidir afinal com os do Liberalismo, a Regeneração, a Refundação do país.
Mas em que ponto se encontrava a luta desses liberais? Num ponto difícil. Em Abril de 1824, D. Miguel tenta novo golpe contra o pai. Cerca o palácio Real e até prende ministros. D, João VI perde a paciência e expulsa o filho para Viana. Mas 2 anos depois, o Rei D. João VI morre (10/3/1826) em circunstâncias estranhas, pairando a suspeita de envenenamento. D. Pedro I do Brasil não quer ser D. Pedro IV de Portugal, embora saiba que só ele pode resolver aquela charada trans-atlântica.
Vem, então, a Lisboa, pela 1ª vez, desde que saiu daqui em criança. É rei por uma semana. Prepara uma Carta Constitucional, que é um meio termo entre Liberais e Absolutistas. E entrega a coroa à filha, futura D. Maria II. A pequena Maria não tem senão 7 anos! Pelo que o pai ordena que o irmão case com a sobrinha e assegure a regência até ela atingir a maioridade.
Neste inesperado volte-face, D. Miguel regressa de Viena, Jura tudo o que lhe pedem e D. Pedro regressa ao Brasil. Neste clima de paz aparente, Garrett volta do exílio. Numa rebeldia acirrada pelo desterro, funda e dirige jornais ambiciosos que não se inibem de atacar o poder político.
Diz Ofélia Paiva Monteiro: “Mas foi tal a militância desses jornais, numa época extremamente convulsa, o cronista teve que acabar, que a censura cortava tanto que ele diz que não é mais de homem de consciência, não é possível continuar a escrever com tal grilhão”.
Diz José Manuel Tengarrinha: “É então que funda «O Português, o grande jornal (1826-1827). É preso. Está 3 meses no Limoeiro, porque, segundo o Governo, nessa altura absolutista, já não virado para o liberalismo, em que as forças absolutistas têm cada vez mais influência, que Almeida Garrett é preso com outros companheiros da redacção do jornal, está preso no Limoeiro, sem culpa formada. O jornal é perseguido e acaba por ser encerrado”.
Depois de D. Pedro partir para o Brasil, D. Miguel negou todos os juramentos. Repõe a censura, faz milhares de presos políticos. Reinstala o Absolutismo. Garrett paga o fim da liberdade de imprensa, com 3 meses no Limoeiro. Uma vez solto não tem outra solução se não voltar ao exílio em Inglaterra.
Que destino aguardava agora Portugal?
“ Meu Carlos, tu estás vivo e são…não é já o sonho, és tu?...Tu, Joana, tu sonhavas comigo? E caiu nos braços dela; e abraçaram-se num longo, longo abraço, com um longo interminável beijo…longo, longo interminável como um primeiro beijo de amantes.” – pp 151.
Carlos e Joana beijam-se a meio da guerra que divide o país. Mas Carlos tem de voltar ao combate. Separam-se, mas juram não dizer uma palavra sobre o assunto. Carlos sofre de amor por aquela mulher em que sua prima se transformara. E sofre porquê? Porque é casado, casado com Georgina, uma bela inglesa.
Diz Tiago Salazar: “Carlos é um personagem que vive disperso entre vários amores, homem de grande coração, compulsivo, de certa forma julga que vai encontrar a paz no meio dos bosques, na lezíria, a solução mas, como sempre, acaba por não ter sorte, acaba por se dispersar”.
E Joana sofre porquê? Porque pressente a verdade e tem que a calar, que vive a paredes meias com a avó, as visitas de Frei Dinis e outros mistérios.
“Atrás da paciente e humilhada figura daquela mulher…se erguia um vulto austero e duro, um homem armado da cabeça aos pés de ascética insensibilidade…um homem que parecia o fado-mau daquela velha, de toda a sua família…o cúmplice e o verdugo de um grande crime…um ser de mistério e terror”.- pp 165
No auge do drama, Carlos é ferido em combate, mas Almeida Garrett, mestre do romance, interrompe a história e regressa ao seu périplo por Santarém.
“Muito me pesa, leitor amigo, se outra coisa esperavas das minhas Viagens, se te falto, sem o querer, a promessas que julgaste ver nesse título, mas que eu não fiz decerto. Querias talvez que te contasse, marco a marco, as léguas da estrada?" - pp 200
D. Pedro teve o mundo a seus pés. Foi Rei de Portugal durante 7 dias e partiu. Ofereceram-lhe os tronos da Grécia e Espanha, mas ele preferiu continuar Imperador do Brasil. Mas o seu comportamento adúltero e autoritário levaram ao descontentamento popular. E, em 1831, é forçado a abdicar do trono a favor de seu filho. Terminaria, assim, tão ingloriamente, a história de D. Pedro IV?
A Ilha Terceira torna-se um reduto de liberais clandestinos. Alexandre Herculano, Joaquim António de Aguiar, Almaida Garrett e forças belgas e britânicas juntam-se ali a Palmela e a Saldanha para preparar o contra-ataque. Mas quem os lideraria? Um homem que ainda não tinha terminado a sua carreira politica. Em 8/7/1832, 7.500 homens, comandados por D. Pedro IV, desembarcaram no Mindelo, chegando ao Porto no dia seguinte para um longo e sangrento cerco à cidade.
O conflito alastra e Portugal está oficialmente em Guerra Civil. É esta a guerra que Garrett revisita em VMT. Guerra que ele deixou no ponto em que Carlos, o herói, está entre a vida e a morte num hospital de campanha.
Diz Murilo de Carvalho. “Então, dá-se um momento muito dramático. A Georgina vem lá cuidar dele, mas já sabe que Carlos não a ama. É uma relação de Anjo da Guarda, mas também muito distante".
“Já sabes que sei tudo, Tudo o quê, Georgina?…Queres que to repita? Repitarei. Que tu amas a tua prima, que ela te adora? E por Deus, Carlos, eu já lhe quero como se fora minha irmã. Entendes agora que te não amo? Compreendes agora que tudo acabou entre nós” - pp 224.
Georgina descobre a verdade, mas, sentindo que o coração de Carlos precisa do seu, vai despertá-lo e devolvê-lo a casa. Do lado de lá da janela, os Constitucionalistas triunfam e a guerra aproxima-se do fim. Mas falta ainda fazer a paz entre as personagens. É então que o enigma se resolve. Ainda na cama do hospital, Frei D. Dinis está diante de Carlos. Este culpa-o por todo o sofrimento da família e prepara-se para o matar com um golpe de fúria, mas, neste momento, irrompem a Joaninha e a velha Francisca.
“Filho, meu filho! - é teu pai, meu filho. Este homem é teu pai, Carlos. O ponderoso velador caiu inerte das mãos do mancebo, e rolou pesado e baço pelo pavimento” – pp 230 e 231.
Carlos Reis diz: “Isto é, no fundo, quem combateu a outra pessoa é filho dela. Está aqui, de alguma forma, projectado ficcionalmente o drama de toda a Guerra Civil, que é uma guerra familiar, que é um desentendimento entre entidades de uma mesma família".
José Miguel Sardisca diz: “É bom nós lembramos que esta Guerra Civil foi o mais importante conflito militar em Portugal durante todo o sec. XIX. Superou em termos de sofrimento físico a participação na guerra entre 1914 e 1918, e mesmo a Guerra de África. Portanto, nós hoje olhamos para a guerra em África, como a guerra mais recente, mas a Guerra Civil que deu o Estado Liberal em Portugal, em termos de exilados políticos, em termos de mortos, em termos daquilo que era o sofrimento físico e imediato, foi a maior confrontação militar dos últimos 2 séculos.”
Em 1834, as forças liberais, por quem combatem (Carlos ficcionalmente) e na realidade Almeida Garrett, Alexandre Herculano e o Rei D. Pedro, derrotam os absolutistas.
Em VMT, Garrett e os amigos encetam o regresso a Lisboa. Ao passarem de novo pelo Vale de Santarém, reconhecem 2 figuras espectrais à porta da Menina dos Rouxinóis: a velha Francisca e o Frei Dinis. Neste instante, em que ficção e realidade (passado e presente) se cruzam, Garrett aproxima-se do velho frade e pergunta-lhe como acabará a história de Carlos e Joaninha. Frei Dinis entrega-lhe então uma carta! A carta que Carlos deixou antes de partir, 10 anos antes.
“É a ti que escrevo, Joana, minha irmã, minha prima, a ti só … nem eu já sei quem são os meus, confunde-se, perde-se-me esta cabeça nos desvarios do coração. Errei com ele, perdeu-me ele… oh, bem sei que estou perdido” – pp 276
Diz Murilo Carvalho: “Carlos escreve a ela aquela carta longa, que é brilhante, porque é uma síntese da vida de um homem perdido, que é o primeiro reflexo real do romantismo na literatura portuguesa e brasileira”.
Diz Ofélia Paiva Monteiro: “Mas essa carta é escrita de Évora-Monte, Maio de 1834, ou seja, no próprio momento da vitória liberal. Garrett tinha consciência de que, é engraçado, como ele funde a história da personagem com a história do país. Realmente, Carlos é uma criatura ficcional em que estão compendiados muitos dos problemas do país”.
Carlos vai revelar-se inteiramente a Joaninha, falar-lhe da pureza que ela conservou e ele perdeu para sempre quando deixou o vale; confessar-lhe que a sua perseguição do absoluto e da perfeição o levou a erros, decepções e paixões sucessivas.
Carlos Reis diz: “Eu acho que essa sucessão de fracassos amorosos do Carlos de VMT são as 3 irmãs inglesas e também uma freira do Convento de São Gonçalo na Terceira, traduz muito bem, por um lado, a volubilidade amorosa do homem romântico, por outro, esse trajecto constante entre o ideal, a tentativa de concretização dum absoluto, no caso um absoluto amoroso, e depois o seu falhanço".
“Creio que me vou fazer homem político, falar muito na pátria com que me não importa, ralhar dos ministros que não sei quem são…e quem sabe?...talvez darei por fim em agiota, que é a única vida de emoções para quem já não pode ter outras” - pp 299 e 300.
Diz Murilo Carvalho diz: “Então, esse conjunto, essa história romântica, de certa forma, eu acho que ele quis fazer um certo paralelo com a própria História de Portugal. O Carlos, o sujeito, eterno emigrante, que vai para Inglaterra…volta, entra numa Revolução, e sai de novo, e acaba cedendo, em tudo, acaba em burocrata”.
O desfecho da história conta-se em poucas palavras: Joaninha enlouquece e morre; Georgina entra para um convento; a velha Francisca e o Frei Dinis permanecem àquela porta, como mortos-vivos; Carlos torna-se barão e, em breve, será deputado. Tal, como Almeida Garrett, será deputado, o João Baptista da Silva Leitão, que combateu pelos direitos do povo, enquanto alimentava sonhos de aristocracia.
Diz Ofélia Paiva Monteiro: “Garrett está muito em exibição, sempre perante um público, vê-se que tinha facetas de um dândi, não há dúvida nenhuma, e narcísicas e, de facto, essa roupa elegante que ele gostava de usar, é algo que compõe a persona, o vulto de Garrett, que, logo na época, foi um pouco satirizada pelos seus contemporâneos".
Diz Jacinto Lucas Pires: “Há uma história que o meu avô contava, não sei se é uma lenda, se é verdadeira, mas tem um pouco a ver com o carácter de AG. Que é que ele teria uma batata da perna falsa, um pouco para fazer o desenho da perna, uma vaidade, dentro dessa personagem do dândi, mulherengo, e que, um dia, um novo criado de vestir, ao despi-o, e que perante o susto, o espanto do criado, que nunca tinha visto coisa igual, ele teria dito «agora ajuda-me a aqui a desenroscar a cabeça, sff.»”
Finda a GC, Pedro IV restitui o trono à filha D. Maria II, mas, meses depois, o rei, sem reino, morre tuberculoso em Queluz, quando tinha 35 anos, no dia 24 de Setembro de 1834. Desaparecia assim um homem tremendo, herói e vilão, duma época notável. Mas cumprira o seu dever. Portugal era agora um reino tranquilo e feliz…ou não?
“O frade era até certo ponto o D. Quixote da sociedade velha. O barão é, quase em todos os pontos, o Sancho Pança da sociedade nova. Menos na graça…porque o barão é o mais desgracioso e estúpido animal da criação…nem eles compreenderam o nosso século nem nós os compreendemos a eles…Por isso brigámos muito tempo, afinal vencemos nós…o barão mordeu no frade, devorou-o … e escouceou-nos a nós depois…Com que havemos nós agora de matar o barão? – pp 106 e 107.
Ao longo deVMT, percebemos em Garrett um tom desiludido com o liberalismo. Mas porquê? E que criaturas terríveis seriam afinal os barões?
Diz José Manuel Tengarinha: “«O barão mordeu no frade, escouceou-os e mordeu-nos a nós depois» Estamos perante uma frase fundamental para se poder compreender a narrativa. Por um lado, tão simplificadamente a evolução espúria, a evolução contra todas as regras morais por que eles tinham lutado e, ao mesmo tempo, o desencanto de Garrett relativamente à evolução da sociedade portuguesa”.
Diz Ofélia Paiva Monteiro: “Este conflito que Garrett diz ser um conflito eterno entre o espiritualismo e o materialismo, que ele vê encarnados nesses 2 grandes símbolos (D. Quixote e Sancho Pança) e que no tempo moderno português ele vê encarnados no frade e no barão".
Quando Passos Manuel chega ao poder em 1836 traz consigo alguma estabilidade, mas o liberalismo falhou a realização plena dos seus ideias de justiça. Minado por resistências populares e divisões internas, falhou o seu destino. 6 anos depois, a ditadura regressa. É o tempo da ascensão da burguesia, dos financeiros, dos materialistas, dos barões, da corrupção e outras vontades de poder.
Diz José Manuel Tengarrinha: “Era a luta pelo liberalismo, uma luta por uma sociedade justa, íntegra, em que houvesse de facto a possibilidade de que ocorresse uma justiça finalmente implantada na nossa sociedade. Isso não foi possível com o liberalismo. Pelo contrário, houve os grandes barões, como Garrett anuncia, que se apossaram do país.”
Diz José Miguel Sardisca: “Os barões tinham substituído os frades, ou seja, uma nova classe média, endinheirada, janota, aburguesada, europeia, tinham vindo substituir aquele velho e antigo regime ligado ao frade, ligado a um certo reacionarismo ideológico e ele pergunta se os barões, ao substituírem os frades, qual foi a melhoria real que isso teve”.
É nesta altura que Garrett redige VMT. Passos Manuel, refugiado em Santarém das guerras de Lisboa, faz o convite e Garrett serve-se da viagem para tecer uma crítica a todo tempo de ilusão e desencanto.
Diz José Miguel Sardisca: “É, portanto, é um momento em que Garrett, do alto dos seus 40 e poucos anos, olha para o país, olha para a liberdade para a qual contribuiu, quando tinha vinte e tal anos, e se pergunta a ele próprio como é que está este país? Foi por isto que eu lutei em jovem, foi por isto que dei quase 20 anos da minha idade, foi por isto que eu estive exilado durante anos a fio?"
Diz José Manuel Tengarrinha: “Ele desiludiu-se com tudo isto. É isso que ele retrata em VMT, é uma obra profundamente pessimista”.
Os 6 primeiros capítulos das VMT são publicados ainda em 1843, em folhetim, na Revista Universal Lisbonense, classificados de "Espirituosa excentricidade literária". A obra completa sairia em 1846. Entre um momento e outro, Almeida Garrett continuou à procura do brilho dos salões, tanto na Assembleia, em que é deputado, como na vida aristocrática, onde os poemas “Folhas Caídas” (1853), como testemunho erótico dos seus amores pela Viscondessa da Luz. E quando Costa Cabral quer silenciar a impressa, com a Lei das Rolhas, é ainda Almeida Garrett quem se ergue para o enfrentar.
Diz Jacinto Lucas Pires:“ Porque desde miúdo, aprendi com o meu avô João, Luís de Almeida Garrett, que, sempre que alguém dizia em casa, «ah… somos descendentes do escritor» ele dizia não, não, nós somos descendentes do irmão do escritor que só escreveu um texto, bastante mau, ou péssimo mesmo, chamado “Viagem a Leixões””.
Com a Regeneração de 1851, sobe ao poder o Duque da Saldanha, velho amigo das lutas liberais, que convida Almeida Garrett para Ministro dos Negócios Externos. Mas, ao fim, de poucos meses, doente e cansado, deixou o Governo.
Em 1854, já com o título nobiliárquico com que sempre sonhou, o Visconde Almeida Garrett morre sozinho, enquanto se entregava à pouco heroica tarefa de decorar a sua casa.
Diz José Manuel Tengarrinha: “Repare que Garrett morre completamente só, morre só, a decorar, com requintes de maneirismos, com requintes de preciosismos, a sua última casa onde ele viveu. E a construir um romance que ninguém percebe o que é, que é uma coisa confusa, “Helena”".
Seria este o destino sonhado pelos heróis do romantismo português?
Diz José Manuel Tengarrinha: “Portanto, o romantismo português é, podemos dizer, esquematicamente, o romantismo revolucionário, porque é aquele que é feito por pessoas que estiveram a viver, participaram, intervieram, na revolução liberal, de armas na mão. Almaida Garrett esteve de armas na mão no cerco do Porto, a lutar. Alexandre Herculano, como simples soldado, no cerco do Porto, foi ferido, até gravemente".
Diz Carlos Reis: “Almeida Garrett foi um grande escritor romântico, mas Garrett foi, não só um escritor romântico, foi sobretudo uma grande personagem romântica. Como os grandes românticos, ele foi, de alguma maneira, uma personagem de si mesmo, uma figura que, além do mais, por outras razões e em outros planos, era uma figura muito teatral, uma figura que representava permanentemente, uma figura dilacerada, por dilemas, por tensões, por conflitos. E é isso que é próprio das figuras dramáticas, como Garrett foi".
Diz José Miguel Sardisca: “A geração dele será sempre uma geração recordada durante o sec. XIX como a dos pais fundadores, que vieram dar a Portugal o progresso, a liberdade que já existia lá fora e que em Portugal não existia”.
D. Pedro IV, Almeida Garrett e o Carlos das Viagens foram heróis românticos em toda a sua dimensão, apaixonados, rebeldes, excessivos e contraditórios. Entre erros e feitos históricos, não ficaram a fazer a revolução no interior da sua cabeça ou numa banal folha de papel. Se livros há com ensinamentos de monta, não encontrará muitas lições mais importantes que esta.
Diz Carlos Reis: “Hoje nós podemos ler as VMT também como uma reflexão constante acerca do risco da degradação de valores, do risco de uma vida pública, de uma vida pessoal, à margem de valores e isso creio que é um problema que nós vivemos de uma forma muito aguda e que está na origem de muitos outros problemas, de resto. Se nós lermos as VMT, essa espécie de reflexão sobre a importância dos valores e de necessidade de estarmos vigilantes em relação aos valores em que acreditamos, as VMT têm uma enorme actualidade".
Almeida Garrett│ Viagens na Minha Terra │ Ed. de Moderna Editorial Lavores