Com licença da Alice Vieira (Crónicas de Alice Vieira - No Centro do Paraíso), que gosta tanto da Ericeira como eu.
«Hoje vou falar-lhes do paraíso.
O meu é a Ericeira—a que eu chamo a minha pátria.
Vivi aqui em criança, numa moradia junto à estrada que é hoje um prédio de quatro andares. Depois ainda vivi em mais três casas diferentes, uma delas ao lado da praça de touros. A casa ainda existe, a praça de touros é que não. Fui lá uma vez, e quem toureava chamava-se “La Princesa”, e precisava da praça toda para conseguir virar o cavalo. Não deve ter tido grande futuro.
Agora moro no primeiro andar de uma moradia, perto da praia, com varandas para o mar–e numa das ruas principais da vila. Quando fui fazer o contrato, um dos funcionários da Câmara até exclamou “como é que conseguiu uma casa num lugar destes?”
É claro que a Ericeira não é paraíso para todos. O sol raramente nasce antes das 4 da tarde, e a água do mar digamos que não é lá muito quente (mas quem quiser água quente, toma banho na banheira). Por isso o Prof Hermano Saraiva costumava dizer “a Ericeira não tem banhistas, só tem devotos”.
Mas devotos incondicionais. Que gostam das praias, do mar, das rochas, das ruas, das casas azuis e brancas, dos cafés, dos bares.
Eu confesso que tenho má fama porque passo a vida nos bares dos meus amigos. (Em tempos normais, agora com o vírus, os bares, para sobreviverem, transformaram-se em snack-bares).
Um dia uma das minhas amigas que têm bares ligou-me a avisar que estava lá um postal para mim. Fui buscá-lo. Dizia só: “Alice Vieira-Ericeira”. Então o carteiro tinha batido à porta do bar e tinha dito: “entregue-lhe, que eu sei que ela está sempre aqui caída.”
E acreditem que estive mesmo a falar do paraíso.»
E eu da Ericeira devoto me confesso!