A RTP2 passou, já nas primeiras horas de hoje, o filme “A Leste do Paraíso”, de Elia Kazan, inspirado no livro, com o mesmo título, de John Steinbeck. É um filme de 1955, considerado um clássico e ganhou, parece, mais que um Óscar. O desempenho de James Dean, no papel de Cal Trask, é colossal. John Steinbeck, que era um escritor místico, aproveitou para nos apresentar uma releitura da história bíblica de Caim (Cal Trask) e de Abel (Aaron Trask).
O filme é feito apenas, como não podia deixar de ser, de uma linha principal, explorando os lados mais ajustados ao registo cinematográfico. Diferenças principais ou aspectos que me surpreendem: a proximidade entre Cal e Abra (namorada do irmão), o que não acontece no livro; imaginei que a Kate (a mãe dos dois irmãos que os abandona ainda muito pequenos), fosse mais bonita; o papel quase apagado do Lee, o “China”;
O final do filme é apresentado de forma bastante diferente, na medida em que Abra toma o papel do Lee. No filme, é Abra que incentiva Adam (o patriarca da família), num último esforço, antes de morrer, a perdoar o filho Cal, a dar-lhe, finalmente, uma palavra de amor, uma atitude que não fosse, como habitualmente, de total desdém, em flagrante contraste com o tratamento dado ao outro filho Aaron.
No livro, o Adam diz apenas a palavra Timshel, antes de fechar os olhos e adormecer para sempre. Contudo, esta palavra é, para Cal, redentora, e basta. Trata-se de uma palavra hebraica, que significa “Tu Podes”. Em termos filosóficos, é talvez, segundo a tese do autor do livro, a palavra mais importante do Mundo. Significa que o caminho está aberto. A responsabilidade incumbe ao homem, pois, se “tu podes”, também é verdade que “tu não podes”. “Tu podes” é algo que engrandece o homem e o eleva ao tamanho dos deuses, porque, apesar de todos os seus erros, é ele (o Homem) ainda quem dispõe da escolha. Pode escolher o caminho, lutar para o percorrer, e vencer. O realizador do filme opta por um final mais ligeiro, retirando, em minha opinião, esta carga filosófica. Assim, Adam, incentivado por Abra, acaba por, finalmente, e por uma única vez na vida, pedir um favor ao filho, que este acata.
Por último, tenho de referir uma cena muito forte, aquela em que o Cal, sempre desprezado pelo pai, quer, como último recurso, comprar o seu amor. Então, e aproveitando o dia de aniversário do pai, preparou um festa e deu-lhe, de presente, um elevado montante em dinheiro, como forma de o compensar do elevado prejuízo resultante do negócio das alfaces e, no fundo, tentar conquistar o seu amor. O pai reagiu mal e, mais uma vez, arrasou o Cal, na presença do outro filho, que, em contrapartida, foi elogiado. O Cal fica de rastos, destroçado, levando-o à revolta e, desta vez, à vingança (levou o irmão a conhecer a mãe que era uma prostituta).
Bem, estamos, definitivamente, perante um bom livro e um bom filme, o que raramente acontece…