Eu que tenho sido submisso, que tenho sofrido, enxovalhado e calado. Eu que sempre amochei. Arre, estou farto! Não, não pode ser. Daqui em diante, vou seguir o conselho do poeta José Régio.
Para tanto, daqui lanço um apelo ao meu anjo da guarda:
Quando eu me poupe a falar, aperta-me a garganta, obriga-me a gritar!
Exortação ao meu anjo
Quando eu me deixar cair
No sonho de adoecer para poder dormir,
Fere-me com a tua lança!
Reaviva em mim a dor, fonte de esperança.
Quando a verdade, que é nua,
Me cegar como um sol, e eu me voltar para onde há lua,
E procurar jardins convencionais e plácidos,
Queima-me com os teus olhos ácidos!
Quando me for mais fácil a verdade do que ter
Um papel de actor qualquer,
Como aos que assim se recreiam,
Faz-me exibir-me bobo ante os que aplaudem ou pateiam.
Quando eu julgar, falando, dizer tudo,
Faz ante mim sorrir teu lábio mudo!
Quando eu me poupe a falar,
Aperta-me a garganta e obriga-me a gritar!
Quando eu tiver medo do Medo
E acender fósforos nos cantos rumorosos de segredo,
Arrasta-me pelos cabelos
Para entre os pesadelos!
Quando, a meio da noite e da ansiedade,
Eu me rojar por terra e te pedir piedade
Não me apareças nem me fales!
Deixa-me só com o meu cálix.
Quando eu te falsificar,
E alugar anjos de serrim em seus braços me embalar,
Derrete o chumbo das casas:
Leva-me no tufão das tuas asas!
Quando eu, enfim, não puder mais
Por tuas próprias mãos belíssimas e leais,
E sem caixões nem mortalhas,
Enterra-me na terra das batalhas.
Quando, depois de morto, a glória
Me levantar o seu jazigo e celebrar minha vitória,
Desvenda os alçapões dos meus escritos
E arranca à terra que me esconde
os mais secretos dos meus gritos!
José Régio
No sonho de adoecer para poder dormir,
Fere-me com a tua lança!
Reaviva em mim a dor, fonte de esperança.
Quando a verdade, que é nua,
Me cegar como um sol, e eu me voltar para onde há lua,
E procurar jardins convencionais e plácidos,
Queima-me com os teus olhos ácidos!
Quando me for mais fácil a verdade do que ter
Um papel de actor qualquer,
Como aos que assim se recreiam,
Faz-me exibir-me bobo ante os que aplaudem ou pateiam.
Quando eu julgar, falando, dizer tudo,
Faz ante mim sorrir teu lábio mudo!
Quando eu me poupe a falar,
Aperta-me a garganta e obriga-me a gritar!
Quando eu tiver medo do Medo
E acender fósforos nos cantos rumorosos de segredo,
Arrasta-me pelos cabelos
Para entre os pesadelos!
Quando, a meio da noite e da ansiedade,
Eu me rojar por terra e te pedir piedade
Não me apareças nem me fales!
Deixa-me só com o meu cálix.
Quando eu te falsificar,
E alugar anjos de serrim em seus braços me embalar,
Derrete o chumbo das casas:
Leva-me no tufão das tuas asas!
Quando eu, enfim, não puder mais
Por tuas próprias mãos belíssimas e leais,
E sem caixões nem mortalhas,
Enterra-me na terra das batalhas.
Quando, depois de morto, a glória
Me levantar o seu jazigo e celebrar minha vitória,
Desvenda os alçapões dos meus escritos
E arranca à terra que me esconde
os mais secretos dos meus gritos!
José Régio
Sem comentários:
Enviar um comentário