Quando, em 1982, Natália Correia era deputada na Assembleia da República pelo PPD e, discutindo-se a despenalização do aborto, o deputado João Morgado, do CDS, defendeu que “o acto sexual é para fazer filhos”, escreveu ela este poema:
Já que o coito — diz Morgado —
tem como fim cristalino,
preciso e imaculado
fazer menina ou menino;
e cada vez que o varão
sexual petisco manduca,
temos na procriação
prova de que houve truca-truca.
Sendo pai só de um rebento,
lógica é a conclusão
de que o viril instrumento
só usou — parca ração! —
uma vez. E se a função
faz o órgão — diz o ditado —
consumada essa excepção,
ficou capado o Morgado.
Em 1982, já estava vulgarizada em Portugal a contracepção oral (vulgo, pílula), que foi um grande avanço para a emancipação da mulher e para o modo mais livre com que ambos os sexos passaram a poder relacionar-se. A uma gravidez não desejada chamava-se ”um descuido” e a despenalização da sua interrupção voluntária vinha permitir que ser-se mãe e ser-se pai, responsabilidades duradouras, não tivesse forçosamente de nascer de um acto situado no tempo, que tivera uma finalidade bem mais breve — o prazer, com ou sem amor. Alegria Breve.
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